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Marco processual: STJ estabelece parâmetros rigorosos para suspensão de passaporte, CNH e cartões na execução

Marco processual: STJ estabelece parâmetros rigorosos para suspensão de passaporte, CNH e cartões na execução

5 de dez. de 2025

A decisão recentemente proferida pela 2ª seção do Superior Tribunal de Justiça representa um marco relevante para a compreensão e o emprego das chamadas medidas executivas atípicas no âmbito do Processo Civil.

Em julgamento unânime, o tribunal consolidou critérios objetivos para a adoção de mecanismos como a suspensão de passaporte, a suspensão de CNH e o bloqueio de cartões de crédito, reafirmando que tais medidas somente podem ser implementadas quando os meios tradicionais de execução se mostrarem insuficientes e desde que observados parâmetros estritos de validade constitucional e processual.


O debate que se desenvolveu no tribunal reflete uma preocupação crescente: como compatibilizar a efetividade da execução com a proteção das garantias fundamentais do executado. O Código de Processo Civil instituiu um poder geral de efetivação, autorizando o magistrado a lançar mão de técnicas coercitivas não previstas de forma típica, desde que justificadas pelas circunstâncias do caso concreto. A decisão do STJ esclarece essa margem de atuação ao exigir, cumulativamente, subsidiariedade, proporcionalidade, razoabilidade, contraditório efetivo e fundamentação específica adequada à situação examinada. A medida deve ter caráter temporário e finalidade estritamente coercitiva, jamais punitiva.


Nesse contexto, merece destaque a participação dos amicus curiae, figura processual cuja função é auxiliar o tribunal em debates de relevância jurídica ou social. Amicus curiae, do latim amigo da corte, é o terceiro que, sem integrar a relação processual como parte, oferece subsídios técnicos ou institucionais para o aperfeiçoamento da decisão. No caso analisado, entidades representativas e estudiosos do Processo Civil trouxeram elementos importantes para equilibrar o debate: de um lado, os riscos de uma tese excessivamente abrangente que engessaria a análise casuística; de outro, a necessidade de preservar a utilidade das medidas atípicas quando o devedor frustra intencionalmente a atuação da Justiça.


A tese fixada pelo tribunal reafirma que, nas execuções civis regidas exclusivamente pelo Código de Processo Civil, a adoção de medidas executivas atípicas é admissível, desde que ponderados os princípios da efetividade e da menor onerosidade, aplicada de modo subsidiário e acompanhada de fundamentação específica e compatível com os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e do contraditório.


O histórico do caso evidencia que a controvérsia não se limitava ao cabimento abstrato das medidas, mas à necessidade de relacioná-las concretamente ao comportamento do devedor. O tribunal de origem havia restringido certas medidas por entendê-las desproporcionais, admitindo apenas o bloqueio de cartões de crédito. A intervenção do STJ restabelece a premissa de que a restrição só é legítima quando demonstrados o insucesso dos meios típicos e a adequação entre a medida pretendida e a finalidade coercitiva da execução.


Ao votar, o relator destacou que a inefetividade estrutural das execuções no país exige soluções proporcionais e juridicamente fundamentadas, e que a suspensão temporária de documentos não configura violação ao direito de ir e vir quando não impede a locomoção física. A preocupação central reside em impedir que as medidas se tornem sanções pessoais dissociadas da busca pela satisfação da obrigação.


No debate final, discutiu-se se seria necessário exigir indícios prévios de patrimônio expropriável do devedor. Apesar de reconhecida por alguns ministros como salvaguarda importante, essa exigência foi afastada pela maioria para evitar que o instituto perdesse sua eficácia justamente nos casos em que o devedor oculta bens ou se mostra resistente ao cumprimento da obrigação. A solução encontrada prioriza o equilíbrio: amplia o poder do magistrado, mas exige rigor procedimental e justificativas concretas.


Assim, a decisão do STJ não apenas reafirma a legitimidade das medidas atípicas previstas no CPC como também delimita seu uso dentro de parâmetros que preservam a coerência do sistema, a segurança jurídica e a proteção do devido processo legal. O resultado oferece orientação sólida para a atuação judicial e contribui para uma execução mais efetiva, sem descurar das garantias essenciais ao Estado Democrático de Direito.

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